Órgãos estaduais e federais devem visitar a comunidade quilombola, que denuncia disparos de armas, queima de residências e incêndios nos arredores da comunidade, nesta quarta-feira, 27.
Rafaela Mazzola e Rísia Lima/Governo do Tocantins
A força tarefa é uma medida emergencial diante de reiteradas denúncias de violação aos direitos da comunidade, acompanhadas pela Sepot desde agosto, quando houve o primeiro contato da comunidade com a Secretaria. Desde então, a Secretaria esteve na comunidade por duas vezes e acompanhou representantes locais em reuniões com órgãos públicos.
No último dia 04 de setembro, a Sepot organizou uma caravana composta pelo Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública do Tocantins (DPE-TO), Universidade Federal do Tocantins (UFT), Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (Coeqto) e a Associação da Comunidade Rio Preto. O encontro entre as instituições e a comunidade gerou o relatório entregue pela Sepot ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) e ao Ministério da Igualdade Racial (MIR).
Articulação com Ministério
Em 05 de setembro, a secretária da Sepot, Narubia Werreria, em reunião com o ministro Silvio de Almeida, entregou, em mãos, o relatório sobre a violação de direitos humanos em Rio Preto. Enquanto o relatório era entregue, denúncias de incêndios em casas da comunidade chegavam à Sepot, o que voltou a se repetir na noite deste domingo.
Desde a primeira visita, denominada “Ação de Proteção aos Direitos dos Quilombolas”, a Sepot mantém comunicação com a comunidade com o objetivo de articular ações que envolvam a sua proteção.
Violações de direitos
Na visita do dia 04, a caravana ouviu relatos que falavam sobre o medo de desapropriação; ameaças de pessoas armadas que estariam queimando e derrubando as casas, além de destruírem as cercas; negação de atendimento à comunidade pelo cartório municipal; demolição da ponte que dá acesso à comunidade; há, ainda, relatos de que existiria ameaça de destruição de maquinário da prefeitura; desmonte da casa de farinha coletiva e da máquina de arroz localizadas na comunidade.
Alguns depoimentos dizem da existência de placas proibindo o acesso ao território quilombola, que estaria sobreposto por uma fazenda; da dificuldade de comprovação de residência ou pertencimento à comunidade por seus membros; obstrução do caminho até a comunidade, impedindo a passagem do transporte escolar; e relatos de dificuldades no registro boletins de ocorrência. Isto além da insegurança alimentar devido à destruição das matas e comprometimento da fauna silvestre dificultando o cultivo de roças.
Tendo conhecimento sobre o processo de desapropriação, a Sepot comunicou a Juíza da Comarca de Novo Acordo, responsável sobre a situação da comunidade, assistida pela DPE-TO, o que resultou na suspensão da audiência de instrução com posterior manutenção da posse do território pela comunidade.
Por fim, foi solicitada a reativação da escola municipal localizada na comunidade. Sobre isso, o prefeito de Lagoa do Tocantins, Leandro Fernandes Soares, presente na reunião do dia 04, garantiu que fará consultas jurídicas e contábeis para verificar a reativação da unidade.
Sobre a Comunidade Quilombola Rio Preto
Conforme o relatório, baseado nos relatos dos moradores, a Comunidade Quilombola Rio Preto surgiu a partir da migração da região de Formosa do Rio Preto (BA) até o município de Lagoa do Tocantins (TO), com data de antes da criação do município, sendo considerada uma ramificação da ocupação do Território do Jalapão. Há registro de aproximadamente seis gerações nascidas na comunidade.
Atualmente, a comunidade é formada por 60 famílias, dessas, 14 residem no quilombo, totalizando cerca de 300 quilombolas. A subsistência acontece por meio da agricultura familiar com plantio de roças e extrativismo.
“A identidade negra quilombola da comunidade Rio Preto é um elemento indiscutível, tornando-se evidente de diversas formas. A relação territorial e a organização tradicional, baseada na confiança e companheirismo, é a expressão pura da filosofia africana Ubuntu”, segundo pontuou a diretora de Proteção aos Quilombolas da Sepot, Ana Mumbuca, no relatório entregue ao Ministério.
A composição dessa identidade, cita o relatório, é marcada por diversas características, entre elas: tradição cultural da dança do Lundu e dos festejos de Santo Antônio; aspectos fenotípicos; casas de adobe e utilização da técnica conhecida como “taipa” com duração secular; cercados feitos de trançados de madeiras; rezas cantadas; pratos e bolos de mandioca com carne de sol e conhecimento sobre o ponto da paçoca pisada no pilão; utilização de balaio,tapiti e peneira; e conhecimento das propriedades curativas das plantas.
Busca por reconhecimento
A garantia da vida em grupo e o direito de continuar vivendo em coletivo, se alicerça nas vivências e tradições culturais. Assim a comunidade iniciou o processo da auto-declaração da sua origem étnica e, ao mesmo tempo, o reconhecimento pela Fundação Palmares, assessorados pela Sepot e Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (Coeqto).
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 68 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, garantiu em favor dos quilombolas, o direito ao território, o que legitima a busca desses povos pelo direito de moradia digna e do reconhecimento da propriedade em favor da coletividade, conforme embasado pelo relatório entregue ao Ministério.
Revisão textual: Hermógenes Sales/Governo do Tocantins
Créditos das fotos: divulgação da comunidade.
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