Por: Bosco Omena, Advogado especialista em Direito Público. Um dos autores da obra jurídica Temas de Direito Público. Editora Dialética. São Paulo – 2023.
A Câmara Municipal acaba de aprovar Projeto de Lei encaminhado pelo Prefeito Davi Almeida que concedeu reajuste dos salários dos Servidores da Saúde com fundamento no art. 69 da Lei Municipal nº. 1.222/08 – Plano de Cargos e art. 40, § 8º da Constituição Federal.
No Memorando nº. 044/2024 – DTRAB/SEMSA, informa que após estudos de impacto orçamentário/financeiro e dentro da reserva do possível, foi consignado apenas e tão somente a concessão do índice de reajuste de 1.79% (um ponto setenta e nove por cento).
Sobre este Memorando do DTRAB/SEMSA, faremos algumas observações que julgamos importantes do ponto de vista jurídico, as quais julgamos equivocadas e desprovida respaldo infralegal e constitucional.
A título didático, convém definirmos o que seja reajuste que nada mais é que a recomposição das perdas inflacionárias do exercício anterior, ou seja, reajuste não representa ganho de remuneração aumento de salário, mas tão somente a restauração do valor monetário dos salários dos servidores do ano passado para o ano seguinte.
Segundo art. 40, § 8º da Constituição Federal, que baliza o fundamento do Memorando, o reajuste deve preservar o valor real com critérios definidos em lei.
- 8º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003).
Atendendo a regulamentação constitucional, o art. 69 da Lei nº. 1.222/08, trouxe a seguinte redação textual:
Art. 69. É estabelecido o dia 1.º de abril como data-base para reajuste salarial anual. (Redação dada pela Lei nº 2814/2021)
A redação dada pelo art. 69 pode passar ligeira impressão que não foi arbitrado um índice de correção podendo no caso ser aplicado qualquer reajuste e, assim fazendo, não ocorreria violação ao princípio da legalidade ao qual o Administrador Público encontra-se vinculado. Grande engano !!!
Pela hierarquia das, se a norma municipal não definiu critérios de concessão se limitando a definir a data-base dos Servidores da SEMSA em 1º de abril, no caso, o comando constitucional assume a totalidade da carga valorativa definidora do índice a ser aplicado no reajuste dos Servidores da Saúde, qual seja, qualquer índice que preserve o valor real da remuneração.
Em sendo assim, aplicando a regra da simetria constitucional e no vácuo legislativo municipal, deve ser aplicado o índice definido pelo Governo Federal (União), cujo índice oficial é de 3,86 (três vírgula oitenta e seis por cento), em estrito cumprimento da Constituição Federal.
Como o percentual oferecido pela Prefeitura Manaus foi de apenas 1,79%, representando um acréscimo de R$ 36,60 (trinta e seis reais e sessenta centavos), na verdade os Servidores da Saúde tiveram REDUÇÃO DE SALÁRIOS, pois o índice oferecido não restaurou sequer as perdas inflacionárias do ano de 2023 o que só seria possível se o reajuste tivesse sido ao menos 3,86 (três vírgula oitenta e seis por cento), índice oficial do Governo Federal.
Tendo como fundamento o Memorando do DTRAB/SEMSA, os Servidores da Saúde ficaram mais pobres em menos R$ 42,32 (menos quarenta e dois reais e trinta e dois centavos), portanto não é verdade que houve um acréscimo de R$ 36,60 como afirmaram os Vereadores da Câmara Municipal, na verdade houve redução de salários algo nunca praticado por nenhum Secretário de Saúde, fato inédito.
Outra justificativa que não encontra respaldo na Lei de Responsabilidade Fiscal, é afirmar que o reajuste da data-base dos Servidores da SEMSA, deve passar por estudos de impacto orçamentário e financeiro e dentro da reserva do possível, subordinando o reajuste dos servidores ao bel alvitre da Secretaria de Saúde a qual decide se paga ou não, confundindo verba vinculada com verba discricionária.
Ora, o reajuste da data-base já está previsto no Plano Plurianual – PPA e na Lei Orçamentária Anual – LOA e toda programação financeira é construída considerando o reajuste anual dos Servidores da Saúde não podendo se admitir que ao início do ano inexista fonte pagadora para o cumprimento da obrigação. Isso fere a Lei de Responsabilidade Fiscal passível de representação no Ministério Público e junto ao Tribunal de Contas do Estado – TCE/AM.
Não há outra forma a não ser concluir por três possibilidades que vem ocorrendo na SEMSA:
(1) desorganização financeira e orçamentária;
(2) desvio de finalidade das verbas públicas já destinadas ao reajuste dos servidores;
(3) falta de vontade política com os Servidores da Saúde.
Resta inegável que os direitos dos Servidores Públicos devem ser preservados o valor dos seus salários por meio da data-base, exatamente para que se vede o retrocesso social com a redução arbitrária dos salários dos combativos Servidores da Saúde impedindo a redução de salários, princípio meta da instituição da data-base.
A Constituição Federal deu atenção especial a vedação a redutibilidade salarial prevista expressamente de forma cristalina em seu art. 7º, inciso VI:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
VI – irredutibilidade do salário (…).
Sem dúvida nenhuma, quando a SEMSA/MANAUS deixa de aplicar o devido índice inflacionário, estamos diante de grave violação constitucional pois isso acarreta REDUÇAO DE SALÁRIOS proibido pela Constituição Federal que não admite tal prática.
A sociedade observa com extrema resignação a total falta de valorização da Gestão Municipal da SEMSA com seu quadro de servidores, sobretudo quando depois de terem atuado de forma heróica no desavio da pandemia COVID 19, serem os principais responsáveis pelo sexto prêmio nacional em Atenção Básica do país, ao final, como retribuição, tenham seus baixos salários reduzidos ao arrepio da leis e da violação às normas constitucionais.
Os Servidores da Saúde merecem tratamento mais adequado com as atribuições que possuem junto a sociedade, pois cuidam da saúde da população de Manaus. Isso é o mínimo que se espera da Secretaria de Saúde.