Lourenço Braga, do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas
lourencodossantospeereirabraga@hotmail.com
Fico à vontade para esta conversa pública neste tempo em que, por não haver eleição, não és candidato a mandato novo, dos muitos que o povo amazonense te confiou ao longo de tua vitoriosa trajetória política. Não corro o risco, portanto, assim espero, de ela ser toldada pela maldade de alguns e parecerem pequenas como homenagem de interesse menor.
Resolvi te escrever porque, ouvindo o rádio enquanto dirigia o carro, fui surpreendido por um “Minuto UEA” que, depois de indicar onde está plantada a nossa Universidade cabocla, no meio da maior floresta do planeta, proporcionando e realizando sonhos de indígenas e de ribeirinhos, tem hoje mais de 20.000 alunos matriculados e já diplomou mais de 77.000 bacharéis, mestres e doutores. Justo o que sonhamos juntos lá no início deste século, o primeiro do milênio, mesmo sem saber que era possível a tanto chegar.
Forjado na política estudantil, desde cedo te fizeste líder, talvez mesmo quando de tua passagem pelo Seminário em Tefé, e comandaste, no Congresso próprio, a eleição de Tarcila Prado de Negreiros, depois tua companheira por décadas, para Presidente da União dos Estudantes Secundaristas do Amazonas, a nossa UESA, vencendo o hoje desembargador aposentado Manoel Neuzimar Pinheiro, no prédio de Departamento de Estradas de Rodagem, sede atual da Escola Superior de Saúde de nossa UEA.
Foste Prefeito de Manaus e, já demonstrando tua preocupação com o setor de educação, que levarias adiante no governo do Estado, resolveste inovar, ante a precariedade da rede física existente, criando escolas em tendas erguidas em diferentes lugares da cidade, projeto abandonado por quem te sucedeu, talvez por haveres contribuído fortemente com a expansão da quantidade dos prédios tradicionais.
Chegando ao comando do governo, sempre com tua atenção firme na educação, criaste o Instituto Superior de Estudos da Amazônia, que imaginavas poder vir a ser o embrião de uma futura universidade, destinado a realizar estudos e pesquisas com relevo para assuntos desta parte do Brasil. O ISEA devia congregar representantes de estados da região – Amazonas, Acre, Amapá, Rondônia, Roraima e Pará – sendo sua coordenação exercida periódica e ciclicamente pelo governador de cada unidade federativa, ou por agente especialmente designado. Sua sede própria chegou a abrigar reuniões e ciclos de palestras, por não mais de dois anos, e o ISEA teve a dirigi-lo, como executivo, Luís Maximino de Miranda Correa, que também já servira como presidente da empresa de Turismo do Estado, a EMAMTUR.
Ao chegar ao comando do Estado pela vez segunda, constatando que o Instituto não chegara a cumprir a missão desejada, convocaste professores da nossa Universidade Federal, dentre eles Randolpho Bittencourt e José Seráfico, para elaborarem projeto de criação do que, então, denominavas de universidade do trópico úmido, sob a compreensão de que a única instituição pública desse nível aqui existente já não era bastante para atender à crescente demanda de jovens que a rede de ensino médio formava, por escolas públicas ou da iniciativa privada, a cada ano. Também não foi adiante, por razões que não conheço.
No terceiro governo, em 2000, incumbiste alguns de teus auxiliares, inclusive a mim, Secretário de Administração, e a José Pacífico, Chefe da Casa Civil, de negociações com o conjunto de faculdades, institutos e universidades particulares, já então numerosas, objetivando comprar vagas nos diferentes cursos para servidores estaduais e descendentes seus, o que não progrediu por falta de acordo quanto a descontos que pretendíamos nos valores das mensalidades, acenando com a pontualidade no pagamento.
Em um sábado de forte calor de dezembro amazônico reuniste em tua casa os que estávamos incumbidos de teu intento e foi quando, ciente das resistências dos proprietários de escolas privadas, passaste a ouvir, animado com a experiência que conheceras em Cuba na formação de médicos de saúde pública, de Robério Braga, secretário de cultura, de Vicente Nogueira, secretário de educação, de Deodato, secretário de saúde, de José Pacífico, da casa civil, e de mim, que dirigia a secretaria de administração e a comissão estadual de licitação, palavras de incentivo à retomada da ideia de criação da universidade do trópico úmido. Teu espírito revolucionário fez que, quase ao meio dia, proclamasses que se era para transferir recursos financeiros tão altos para os particulares, que rejeitaram as propostas que lhes fizéramos, melhor era, mesmo, aplicar o dinheiro público em uma universidade pública, que viesse a somar com a federal existente, uma das três mais antigas do Brasil. E nos incumbiste, a Pacífico e a mim, de te apresentar projeto de lei a ser enviado à Assembleia cuidando do assunto.
Em 12 janeiro de 2001 sancionaste a lei 2.637, que autorizou o Executivo a criar, como fundação pública, a Universidade do Estado, e firmaste, na mesma oportunidade, decreto que instituiu comissão incumbida dos atos subsequentes, com os titulares das pastas de cultura, saúde, educação e administração, justo as áreas de conhecimento definidas como de atuação inicial da novel instituição.
E foi assim, Caboco, que em 1º de fevereiro de 2001 – depois de Robério e eu havermos consultado nossos gurus João e José Braga, que nos orientaram no que devia ser escrito – assinaste, sem solenidade, em reunião simples em teu gabinete, presentes José Alves Pacífico, Ruy Cantanhede, Gutemberg Alencar, Vicente Nogueira, Robério Braga, Francisco Deodato, João Coelho Braga e eu, o decreto que criou a nossa UEA.
No dia seguinte, para minha surpresa, me nomeaste reitor, o primeiro, e já em maio realizamos o maior vestibular do Brasil, até então, com mais de 160 mil candidatos de todo o Amazonas, em demonstração inequívoca de aprovação do teu ato de audácia, número superado no ano seguinte, quando 230 disputaram as vagas postas em disputa.
No mesmo ano, ordenaste que realizássemos curso para graduação de professores das séries iniciais das escolas públicas e aí tua ousadia nos contaminou e a inovação de um modelo próprio de ministração de aulas com sistema que utilizou televisão, rádio, telefone, antenas parabólicas e banda de internet especialmente alugada junto à Embratel – ainda hoje em uso segundo proclama a propaganda do “Minuto UEA” que referi ao início, naturalmente que com a modernização possível e necessária – conseguimos transformar a instituição nascente na maior universidade multicampi do País, chegando aos 62 municípios do Estado. Foi para onde falaste, em discurso pleno de emoção, pela vez primeira, em 05 de janeiro de 2002, instalando o maior Programa de Formação de Professores de que até agora se tem notícia, o nosso PROFORMAR que graduou, nas duas turmas que se seguiram, mais de 15.000 docentes de 1ª a 4ª série do ensino fundamental em todo o Amazonas, correspondente a 98% da rede pública. O único estado brasileiro a conseguir esse privilégio que ainda hoje é um divisor de águas na qualidade de nossa educação.
Construímos ao mesmo tempo sede própria da Universidade em 13 municípios do Interior, além de outras quatro em Manaus e, afinal, a Reitoria, e ainda em 2002 fizeste a aula de abertura do primeiro mestrado em Direito da história do Amazonas, até hoje o único do Brasil em Direito Ambiental. E foi igual com o curso de mestrado em saúde pública, que depois incorporou o doutorado, além de outros três na área de engenharia, que terminou por anexar a antiga UTAM. Além disso, há que registrar o Curso de Ciência Política, que formou 930 alunos em 13 municípios do Interior do Estado. E a Telemedicina, de Cleinaldo, que se faria reitor, e de Pedro Elias, secretário de saúde, que já permitiu mais de 250.000 exames de imagem realizados no Interior com leitura e diagnóstico feitos em Manaus.
Vinte anos depois, temos André Zogahib, aluno de primeira turma da UEA, que se graduou, cursou mestrado e doutorado e é hoje reitor da Instituição. No pleito mais recente para governador, um dos candidatos é indígena e médico formado pela nossa universidade dos povos da floresta. Assim também se deu com o procurador-geral da Casa, aluno da primeira turma de Letras, em Parintins, onde depois estudou Direito e chegou a ser Diretor do Centro de Estudos local.
Foi por isso, Amazonino, que ao ouvir o “minuto UEA” enchi-me de orgulho e me rendi em homenagem a tua extraordinária capacidade de gestão e a tua visão de futuro, empreendedor e corajoso, com a dignidade dos que sabem ousar.
Quando saíste do governo e novamente assumiste a Prefeitura de Manaus, sabendo de tua constante preocupação com a educação, te entreguei projeto de lei, com a mensagem respectiva de encaminhamento à Câmara Municipal de Manaus, criando o Bolsa Universidade, em que tratei de modernizar o que deixara o alcaide anterior, deputado Serafim Corrêa, que implantaste e que já há de ter contribuído para a formação de dezenas de milhares de alunos nas instituições privadas de ensino superior.
Muito fizeste por este Estado, caro amigo, nos diferentes setores, na cultura, na saúde, na segurança, na infraestrutura, na economia, no desenvolvimento do Interior, na ação social, mas considero, se me permites, que a Universidade é a obra de uma vida.
E isso te escrevo no Dia de Ação de Graças, para curvar-me à força Superior que nos permitiu essa construção de 20 mil alunos de agora e mais de 77.000 graduados, mestres e doutores referidos na propaganda institucional.